Descobrir a pista de dança depois dos noventa anos

“Abençoado lar que nos leva a todo o lado”. A frase simboliza gratidão e contentamento pela experiência que marcou o Dia dos Namorados no universo sénior das respostas sociais da Santa Casa da Misericórdia do Fundão (SCMF). Foi verbalizada por Maria Joaquina Gonçalves, minutos depois de dezenas de utentes SCMF terem participado na iniciativa «One Billion Rising Solidarity», dinamizada pela Coolabora, e que teve como objetivo demonstrar à sociedade que é possível libertar o espírito e a mente numa dança coletiva pelo fim da violência contra as mulheres.

Depois de hora e meia na discoteca, Maria Joaquina Gonçalves já não conseguia estar mais tempo de pé. Embora tenha passado grande parte da tarde sentada a observar as danças de outras pessoas que com ela partilham a vida no lar da Misericórdia, no Fundão, Maria Joaquina, de 92 anos, confessa-se “estafada”, mas também não esconde que “gostei muito de vir aqui”.

Maria Bárbara Batista Taborda e Maria Joaquina Gonçalves

Na tarde de dia 14 de fevereiro, os seniores de várias idades que estiveram na Companhia Club, na Covilhã, viajaram no tempo e na história de grandes canções. Uma experiência impar na vida de grande parte daquelas pessoas que ou nunca tinham ido a uma discoteca ou pisaram uma pista de dança faz muitos e muitos anos.

Há iniciativas maravilhosas e esta fechou com chave de ouro a «Semana dos Afetos» que durante dias marcou as atividades nos lares e centros de dia da SCMF.

Maria Bárbara Batista Taborda, utente no Centro Comunitário Minas da Panasqueira (CCMP), de 79 anos de idade nasceu em Alcongosta e já tinha ido a uma discoteca quando o marido estava no estrangeiro. Foi na Alemanha que entrou pela primeira vez numa pista de dança. Embora manifestasse algum desconforto nas pernas e nos pés, a expressividade dos olhos azuis de Maria Bárbara deixam transparecer a alegria e apreço por uma oportunidade “diferente do habitual”. Se bem que no CCMP “fazem sempre o melhor partilhando connosco estas boas iniciativas”, diz-nos com um sorriso que denota boas energias.

A atividade mereceu o elogio da psicóloga júnior na SCMF Beatriz Aparício, ao sublinhar que a ida à discoteca demonstrou que aquelas pessoas “têm ainda muita vida e experiências para descobrir” o que se torna valioso na medida em que “os homens e mulheres de idade avançada comprovam que ainda têm muito para viver e que os motiva experiências desta natureza”. “A dança associada à música e ao humor, sentirem que ainda conseguem fazer muitos movimentos, cantar, fazer rir outras pessoas, sabendo estar em grupo, motiva-os e enche-os de energia”.

Uma alegria contagiante disse-nos Maria Martins Duarte que teve o primeiro contacto com uma pista de dança no Inatel de Vila Nova de Cerveira, aquando dos passeios em que ela e o marido, também utente na SCMF, “saltavam e dançavam até a festa acabar”.

Do Centro de Dia do Pesinho, destaque-se ainda o testemunho de Beatriz Trindade que foi ao cabeleireiro e se preparou a rigor para o regresso à discoteca. “Foi mesmo muito bom, tenho pena que as pernas de alguns de nós já pesem”, disse entre gargalhadas e sublinhando o ambiente de festa e boa-disposição que marcaram a viagem entre o Pesinho e a Covilhã.

Também Maria Ascensão Vaz Serra gostou muito da primeira iniciativa em que participou fora do Centro de Dia do Pesinho que frequenta desde dezembro último.

De Alcongosta e a viver no CCMP, António Dias Miguel não sabia que a iniciativa «One Billion Rising Solidarity» se destinava a sensibilizar a sociedade pelo fim da violência contra as mulheres. Essa foi a questão menos relevante no estado de alma do nonagenário que gostou muito de “ver toda a gente a abanar-se de um lado para o outro, a mexer. Ainda bem! Fui e gostei muito”, descreveu.

António Dias Miguel

Marina Abrantes é diretora técnica do lar da Misericórdia e do lar Nossa Senhora do Amparo em Aldeia de Joanes, falou-nos do que representou para os utentes daquelas respostas sociais a ida à discoteca. “Para alguns traduziu-se na experiência única de pisar uma discoteca, um ambiente novo e desconhecido para eles, ajudando a clarificar a opinião previamente formada do que é uma discoteca. Depois, esta foi uma oportunidade de recordar algumas canções intemporais”, disse.

Isso mesmo vincou Florentino Lampreia de 80 anos. Gostou “imenso das músicas sul americanas” valorizando a iniciativa que “nos permitiu dar esta passeio e sair do lar” da Misericórdia.

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