Viver a Quinta com o Fundão no Coração

“Mantenham este espaço sempre assim. Equilibrado, diversificado e cheio de experiências”. O conselho é simultaneamente um elogio e foi registado na tarde de 19 de julho na Quinta Pedagógica do Fundão. As palavras são da líder de um grupo de escuteiros de Mira Sintra. Quando o litoral vem ao interior é sempre uma festa. E se as pessoas oriundas da metrópole trouxerem a Beira no coração, então isso enche-nos de orgulho. Faz-nos crer que vale a pena continuar a acreditar nas potencialidades do território capaz de cativar turistas de todas as latitudes. O grupo de crianças dos sete aos treze anos, divide-se entre lobitos e exploradores do Agrupamento de Escuteiros de Mira Sintra. Estão acantonados no Campo Escutista da Gardunha e dedicaram a jornada à descoberta da Quinta Pedagógica da Santa Casa da Misericórdia do Fundão.

A atividade iniciou-se com a habitual visita guiada ao pomar, horta, jardim das aromáticas e animais da Quinta. Depois do almoço na pérgula, a seguir às corridas e voltas no baloiço e à descoberta da casa do parque das brincadeiras, decorreu o atelier “mãos na massa” com direito a pães de chouriço personalizados. Estender a massa, envolve-la com azeite, colocar uma pitada a mais de farinha, recheá-la com chouriço e enrolar a massa é obra de mestre pasteleiro mas as crianças desempenharam a tarefa na perfeição. Os pães de chouriço deixam-nos com água na boca.

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Seguiu-se o atelier de rocas de alfazema. A roca é uma espécie de cápsula que guarda as flores e sementes de uma erva aromática. As crianças colheram ramos de alfazema, uma a uma transformaram a planta em roca elegante e intensamente aromatizada. O cheiro a alfazema que nesta altura povoa os canteiros da Quinta está agora guardado na roca que posteriormente pode ser colocada nas gavetas e armários lá de casa por forma a perfumar a roupa, evitando que as traças se apoderem do vestuário.

Curiosidades apreendidas pela criançada que veio da Mira – Sintra à Beira Baixa para conhecer a terra da cereja, usos e tradições da paisagem poética de Eugénio de Andrade ou passear pelos campos de trigo que inspiraram a poesia de Albano Martins.

Algumas das crianças já tinham ouvido falar do Fundão, outras já vieram à região no tempo da neve e das cerejeiras em flor. No grupo também estavam netos de fundanenses e beirões por afinidade a Monsanto – a aldeia mais portuguesa de Portugal à qual os anos 90 do século XX  juntaram o título de Aldeia Histórica de Portugal.

Martim Raposo de oito anos é neto de Maria Emília e António da Conceição e já nestas férias grandes tinha estado no Fundão. Nunca tinha visitado a Quinta Pedagógica mas gostou da experiência pois “isto é muito giro”. Gabriel Baptista tem nove anos, veio de Massamá e acrescenta que o Fundão simboliza “alegria, amizade, animais e novas aprendizagens e experiências”.

Leonor Sousa tem a mesma idade mas veio de Rio de Mouro e costuma visitar com frequência. “Pelo menos duas vezes por ano. Na Páscoa e no Verão”, acrescenta a mãe, Carla Joaquim, que tem os pais em Monsanto. A pequena Leonor vinca a mais-valia do acampamento no sopé da serra da Gardunha. “O campo escutista da Gardunha é muito fixe e na Quinta gostei de tudo”. A mãe que gosta de voltar às origens lembra-nos que aqui “faltam oportunidades, trabalho e novos incentivos”.

A conversa flui e há quem recorde a luta dos locais pela isenção de portagens na principal via de acesso da Beira Interior ao Litoral e à vizinha Espanha. Trocam-se opiniões e ficamos com a sensação de que para os turistas oriundos da região de Lisboa passou despercebido o Conselho de Ministros extraordinário que a partir de Pampilhosa da Serra reviu o Programa de Valorização do Interior.

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A clarividência não merece surpresa. É que além de Leonor Sousa também os restantes monitores e responsáveis pelo grupo de escuteiros de Mira Sintra já estão habituados aos anúncios de medidas cujo impacto é questionável. “Veja-se o caso da diminuição de vagas para o ensino superior em Lisboa e no Porto! Em termos reais as vagas passaram a estar disponíveis em Aveiro e Braga”, lamentou outro dos dirigentes habituados ao ceticismo de quem resiste à falta de empresas e empregos no Interior.

Mas voltando à alegria da criançada que fez 300 quilómetros para vir à descoberta do Fundão. Susana Victorino tem nove anos e no regresso a Mira Sintra levará na bagagem a aprendizagem na Quinta Pedagógica do Fundão. “Aqui encanta-me a paisagem e a diversidade de plantas e animais” que povoam o espaço inaugurado há três anos.

E neste espaço de visitação também se pode andar de burro. Foi o que fizeram as crianças de um Centro de Aprendizagem em Alcains que, nessa quinta-feira de julho, também visitavam a Quinta. Leonor Serraninho de nove anos descreveu o passeio como “uma boa experiência” capaz de deixar a nu a docilidade do jumento que “sabe comportar-se com pessoas em cima dele”, acrescenta Matilde Afonso de dez anos. “Foi um passeio tranquilo e o burro é meigo”, sintetiza.

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A Quinta Pedagógica do Fundão recebe frequentemente visitas de estudo de escolas e centros de tempos livres, lares e centros de dia. O espaço de dois hectares é procurado para aulas práticas de ciências da natureza, experiências e contacto com a vida no campo.

Por ali também é habitual decorrerem eventos regionais e concelhios. Recentemente, o celeiro da Quinta (espaço fechado recheado de alfaias agrícolas e outras antiguidades associadas à lavoura) acolheu uma formação para cães de companhia e intervenção social. No dia 29 de julho terá lugar, nesse mesmo espaço verdejante e convidativo, a comemoração concelhia do Dia dos Avós.