São cerca de duas dúzias de idosos e reúnem-se uma vez por semana no auditório da Academia de Música e Dança do Fundão (AMDF). Vêm de lares e centros de dia da Santa Casa da Misericórdia do Fundão (SCMF) e partilham o gosto pelas canções.
O projeto iniciou-se em 2015 com o objetivo de capacitar as respostas sociais de apoio aos séniores na concretização de renovadas dinâmicas e estímulos que promovam a longevidade.
Não é novidade a existência de estudos académicos que atestam as mais-valias do reencontro das pessoas de mais idade com o património imaterial da música e das tradições. Nesse contexto a SCMF aproveitou as competências do corpo docente da AMDF e lançou o Coro Sénior da Instituição.
Todas as semanas uma professora de música e canto entrega-se ao piano e desafia as coralistas e escolherem o reportório de que mais gostam. Os homens também dão uma ajuda. Embora sejam em menor número também dão achegas quanto a temas populares e intemporais ou juntando o timbre mais forte a um registo em que a interpretação de conjunto é, às vezes, enriquecida com solos e segundas vozes.
No outro dia o reportório do ensaio contemplava a interpretação de uma canção popular alentejana e Florentino Lampreia, que é de Mértola mas está institucionalizado numa das respostas sociais da SCMF, fazia um solo no tema “Meu Lírio Roxo do Campo”.
A música que chegou a fazer parte do reportório da cantora luso descendente Linda de Suza não é das mais fáceis de interpretar mas Florentino entrega-se à letra, embebecido pelo espírito de uma declaração de amor e de boas-vindas à Primavera.
Mais conhecido mas não menos difícil de interpretar é o tema “Verdes são os Campos”. Um poema de Luís de Camões tantas vezes interpretado por José Afonso. Zéca Afonso é o artista em destaque nesta temporada do Coro Sénior da SCMF e ninguém fica indiferente à alma do malogrado cantor de intervenção.
Ao mesmo tempo que a professora Carla Duarte estimula os coralistas a acertarem o timbre ao piano eis que o calendário os faz lembrar de abril e das canções da revolução. Daí até ao hino Grândola Vila Morena a distância é curta e na memória daquelas pessoas está o 25 de abril de 1974 e a importância do hino do movimento das forças armadas no golpe de Estado.
Trocam-se opiniões, ouvem-se vozes e há quem manifeste o desejo de interpretar o hino do movimento das forças armadas na próxima sessão solene evocativa do 25 de Abril no Fundão. A ideia agrada sobremaneira à professora que logo ali começa a idealizar a orquestração com outros músicos da AMDF.
Este é apenas um exemplo do efeito do grupo coral nas reminiscências geradas pelas canções antigas e como as mesmas influenciam a qualidade de vida destas pessoas.
A memória, socialização e bem-estar estão, pois, associadas à perseverança e longevidade dos séniores da SCMF que participam nas dinâmicas de grupo em que a alegria e a música são o elo mais forte. Basta ver o entusiasmo de todos !
Albertina Amélia é uma dessas vozes e a inspiração e bem-estar permitiram-lhe criar uma letra que é um hino à SCMF. A letra e música ouviram-se pela primeira vez em maio de 2015 aquando da inauguração da Quinta Pedagógica do Fundão e na presença da então Ministra da Agricultura Assunção Cristas.
Albertina lembra-se bem da responsabilidade e ainda tem algumas quadras na ponta da língua. Portadora de boas memórias, Albertina também é capaz de enumerar todos os momentos altos do percurso do Coro Sénior.
Três anos após a constituição do grupo coral sabe-lhes bem recordar que já aturaram em vários palcos no Fundão, Minas da Panasqueira e Donas. “Uma vez atuámos na igreja com os estudantes da Academia”, diz Albertina Amélia referindo-se ao “Concerto Gerações” que reuniu dezenas de séniores , jovens e crianças numa viagem pela canções tradicionais.
É o caso de “Maria Faia” do grande Zéca Afonso. Está no reportório que por estes dias se trabalha por forma a garantir que o tema, que tanto entusiasma o grupo, fará parte das atuações do Coro Sénior previstas para a próxima Primavera e Verão. “Brevemente haverá uma audição com a classe de acordeão”, garante a maestrina Carla Duarte.