Uma Dança de Aromas

Segue calma e serena a canícula do Verão de 2017. Estamos a meio de agosto e não falta produtor agrícola a levar as mãos à cabeça ou a levantá-las para o céu pedindo a São Pedro que mande umas pinguinhas de chuva. As altas temperaturas que caracterizam o clima mediterrânico também se fazem sentir na Beira Baixa e nem os espaços de lazer escapam às horas de mais calor.

Mas no Fundão há um equipamento de diversão e lazer com dinâmicas que surpreendem o mais impaciente dos visitantes. Na Quinta Pedagógica da Santa Casa da Misericórdia do Fundão, os canteiros floridos e verdejantes são agora menos apelativos mas nos triângulos de ervas aromáticas há experiências que vale a pena realizar.

Foi o que observamos nesta sexta-feira que antecede um fim-de-semana comprido para alguns e de despedidas do Verão para outros. Quem trabalha e quem está de férias encontra-se com a natureza neste jardim encantado às portas da serra da Gardunha e pode ser desafiado a sentir os cheiros do jardim dos chás e ervas aromáticas que, mesmo debaixo de um tórrido sol de Verão, sobrevivem e são suplemento de atração para quem visita a Quinta Pedagógica.

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Hoje de manhã os aromas das aromáticas despertaram a atenção das dezenas de crianças e famílias que visitavam a Quinta Pedagógica do Fundão. Enquanto as andorinhas sobrevoavam o céu, e a pequena Carlota abanava a cauda de contentamento com a presença das crianças que lhe faziam festas, debaixo da árvore de maior porte na Quinta a miudagem fazia uma roda à volta do canteiro dos perfumes.

Abeiraram-se do cantinho da hortelã chocolate para ouvirem as explicações da guia turística sobre o poder das folhas de hortelã e de como as mesmas podem curar uma simples dor de barriga.

Mais tarde, quando o calor apertava mesmo, encontrei um outro grupo de crianças no celeiro da Quinta Pedagógica. O espaço que é uma espécie de armazém de velhos utensílios agrícolas e de uso doméstico costuma ser utilizado para festas de aniversário e outras brincadeiras. Mas no sótão “escondem-se” outros “segredos” da Quinta e até há quem lhe chame a secadeira das aromáticas.

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Seja como for, a verdadade verdadinha é que no sótão do celeiro da Quinta Pedagógica do Fundão há um estendal de plantas aromáticas. Umas estão mais secas que outras e algumas ainda só estão agora a chegar. O momento da chegada pode ser divertido. Que o digam a Matilde, o António ou o Ivo. Os três estavam incluídos num grupo de visitantes de Alcaria (Fundão) que passaram o dia na Quinta Pedagógica do Fundão.

Chegaram logo de manhã e deixaram-se contagiar pela energia dos animais e as corridas no parque das brincadeiras. Fizeram muitas perguntas sobre a plantação de girassóis e renderam-se aos peixes do lago. Depois colheram hortelã e na parte da tarde criaram pequenos ramos de hortelã chocolate que posteriormente estenderam a secar no cordel do sótão.

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E ali ficaram ao lado dos outros ramos de hortelã-pimenta numa dança de aromas que tão cedo as crianças não irão esquecer. António tem sete anos e é pouco dado a criar números. Quando lhe peço para colocar o ramo na corda ao mesmo tempo que o fazem os restantes amiguinhos do ATL de Alcaria, António reclama e lembra que está ali para concluir a tarefa prevista na experiência com ervas aromáticas.

António mora no Tortosendo e apesar de estar concentrado nas aromáticas verbaliza satisfação por ter passado o dia num espaço “grande, com muitos animais e vegetação”.

Mais acessíveis às perguntas da repórter, Matilde e Ivo não escondem a alegria de terem passado o dia num lugar onde conheceram “coisas novas, como aprender a secar o chá e as ervas de cheiro” e que também lhes permitiu terem contacto direto com alfaias agrícolas e utensílios agrícolas do tempo dos bisavós ou praticarem jogos tradicionais.

A Quinta Pedagógica do Fundão é “bastante procurada” por escolas e centros de tempos livres mas nas férias de Verão recebe “muitos visitantes” anónimos que “nos chegam de várias partes do país e do estrangeiro”, pois este é um tempo de “muitos emigrantes”, esclarece Filipa Melo que nesta sexta-feira de agosto também foi guia de um outro grupo de crianças que vieram do Conservatório Regional de Música da Covilhã.

Quando há sol, plantas e a alegria das crianças estão reunidas as condições para se iniciar uma dança de aromas.

A Aventura de Trabalhar a Terra

Fomos ao encontro de três jovens estudantes na Escola Profissional do Fundão que realizaram estágios curriculares na Quinta Pedagógica da Santa Casa da Misericórdia do Fundão.

Caíto Djaló tem o mesmo sobrenome de Yannick que foi jogador do Sporting e do Benfica. Um e outro nasceram na Guiné Bissau. Mas o percurso dos dois nunca se cruzou. O jovem Caíto está no Fundão para concluir o ensino secundário e enveredar por uma licenciatura. Já o jogador que vestiu as cores da seleção de Portugal continua a dedicar-se ao desporto e ainda é uma referência do futebol. O jovem Caíto que estagiou na Quinta Pedagógica do Fundão está na região ao abrigo de um protocolo de cooperação entre os municípios do Fundão e de Bissau.

Caito tem 19 anos, reside no Fundão, e tal como Tiago Mendes de 16 anos, que mora em Valverde, concluiu o 10º ano de escolaridade do curso profissional de gestão de ambiente. Faz um balanço “muito bom” de um estágio que lhe permitiu “aprender a sachar, alimentar os animais e aproveitar a alfazema”. Embora o curso lhes ensine a calcular cotas e declives, a fazer escalas e a ler relevos, os estagiários da Escola Profissional do Fundão admitem que a teoria que trazem da aprendizagem não se coaduna com a experiência de um mês de trabalho na Quinta Pedagógica do Fundão. Mas isso não os desmoralizou!

Só o calor e os primeiros dias em que foram convocados a ajudar nos trabalhos agrícolas lhes causaram algum desânimo pois “estava imenso calor” e mondar erva não é, de todo, o forte destes estudantes.

Da aprendizagem na escola retiram a experiência que os ajudou a “identificar o ADN da cereja”, explica Daniela Carvalho de 18 anos e residente em Vale de Prazeres. “Aqui na quinta também aprendi muita coisa que desconhecia. É o caso do nome de algumas plantas e as suas propriedades, às vezes medicinais”.

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E em que medida é que o estágio consolida aprendizagem e acrescenta experiência para o percurso fora da escola?

Daniela afirma que o estágio a ajudou descobrir a dureza da vida no campo. “Nunca pensei que o campo fosse tão duro e admira-me como é que os agricultores conseguem manter-se tanto tempo debaixo de sol e expostos às mudanças climáticas”.

Não sabemos se a gestão do ambiente pode ajudar a melhorar as boas práticas e dinâmicas na Quinta Pedagógica do Fundão mas temos a firme convicção de que os jovens estagiários são portadores de ideias interessantes e capazes de acrescentar valor à programação pedagógica e de laser desta resposta da Santa Casa da Misericórdia do Fundão. Caíto Djaló sugere a plantação de “mais árvores de fruto, mais animais e mais colaboradores”. “O ciclo da vida nos animais” ou a “recriação das tradições à volta da matança e aproveitamento da carne de porco”, foram outras das sugestões.

Embora tenham gostado de conhecer o mundo rural, quase todos preferem realizar o próximo estágio em contextos diferentes. Caíto tem interesse “na análise e monitorização da água potável”. Mas como já tem alguns conhecimentos em gestão ambiental também gostaria de descobrir o essencial sobre “gestão e acompanhamento de ecopontos”. A gestão de resíduos sólidos urbanos poderá ser uma das linhas de ação no mercado de trabalho destes jovens frequentadores do ensino profissional. Mas nem todos estão decididos a enveredar por essa área. Daniela está determinada em viajar e conhecer outras realidades. Mas também admite vir a ser “bombeira profissional”.

Menos ambicioso é Tiago que pretende elaborar o relatório de estágio, fazer os exames e fazer uma pausa nos estudos.”Quero sair da escola” afirma com convicção o jovem que gosta de “informática”.

Da experiência na Quinta Pedagógica da Misericórdia do Fundão, os estagiários levam as práticas de acompanhamento e assistência aos visitantes, batismo equestre, a prática de jogos tradicionais e os workshops mãos na massa ou de aproveitamento de ervas aromáticas.

Neste dia o grupo de estagiários estava a fazer rocas de alfazema. E havia um suave perfume no ar…..

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